sábado, maio 12, 2007

Património Mineiro e Industrial em Rio Maior . Parecer do IPPAR (Partes 4 e 5)

IV. Importância patrimonial.

4.1. Mina/ Fábrica de Briquetes.

a) A fábrica de briquetes é o mais importante testemunho material da actividade técnica da mina, correspondendo a um período de afirmação da indústria por parte do estado e a um relançamento da própria economia da mina.
b) A sua relação com a cidade é inequívoca (5) quer na sua implantação a uma cota mais elevada, quer na sua ligação axial com algumas das vias de circulação, perspectiva hoje um pouco interrompida com as novas construções e soluções urbanas implantadas.
c) O edifício ou conjunto fabril, não podendo ser dissociado do fenómeno geológico e territorial da mina, representa um dos momentos mais singulares para Rio Maior na afirmação de uma arquitectura industrial coeva aos princípios de uma modernidade que se revê em premissas funcionais e formais reveladas na sua geometrização de formas puras como resposta a uma função puramente fabril.
d) A fábrica de briquetes, por outro lado, simboliza, ainda para Rio Maior um momento maior da sua identidade mais recente, assente nos trabalhos da mina que decorreram ao longo de grande parte do século XX e que criaram uma fenomenologia social intrínseca à própria cidade.
e) Mesmo a nível nacional a fábrica de briquetes constitui um exemplo único, quer na sua relação com a mina, quer na sua materialização e funcionalidade.









(5) Ver ficha de inventário realizada pelo arquitecto Nuno Rocha, Junta de Freguesia de Rio Maior.

4.2. A Moagem.

a) A moagem Maria Celeste é um dos exemplos do património industrial mais significativos de Rio Maior, representando um momento de modernização da forte tradição moageira dependente de princípios funcionais mais ancestrais, reconhecidos nos moinhos de água ou azenhas, e que a própria moagem na sua manifesta actualização vai incorporar parcialmente.
b) A moagem cristaliza um tempo técnico, construtivo e formal reconhecido na identidade do lugar e na manutenção desses valores aliados à sua qualidade e autenticidade indiscutíveis. A própria incorporação e manutenção do sistema energético inicial ampliam o seu valor patrimonial, bem como a manutenção e integridade do programa inicial, da volumetria e da sua linguagem formal.
c) O contexto rural, a relação e diálogo funcional da moagem, plenamente assumida com o rio e com o espaço de hortas mais vasto, mantendo um espírito coevo dos anos trinta releva, igualmente, a sua importância patrimonial.











V. Salvaguarda.

a) Tanto a fábrica de briquetes como a moagem devem de ser classificadas como imóveis de valor municipal.
b)
A manutenção destas duas evidências materiais acrescenta valor identitário e exemplifica, qualificadamente, fenómenos de arquitectura e património industriais e mineiro reveladores da história do século XX da cidade e também do país. A sua incorporação no futuro desenvolvimento urbano só poderá, assim, qualificar pela diferença e pela qualidade, o tecido urbano de Rio Maior, acrescentando o valor de uma memória colectiva que é de todos.
c) A perpetuação da fábrica de briquetes que, certamente, terá um programa de refuncionalização condigno com a história do local deverá de ser desenvolvido com uma atenção especial para o contexto envolvente, ainda referente à área mineira, desejando-se a realização de um plano de pormenor para o conjunto, que qualifique e redimensione, de novo, esta área extremamente importante para a cidade.
d) Os valores descritos e referentes à moagem Maria Celeste devem de ser igualmente salvaguardados, não devendo deixar-se perder toda a aura que o local emana de um tempo técnico e fabril associado aos elementos mais perenes da natureza, como o rio.

Lisboa, 5 de Julho de 2006
A técnica superior
Deolinda Folgado


Nota Final: (CPDP)

Em face do risco efectivo de degradação irreversível do Património Mineiro Riomaiorense e da sugestão veiculada pelo executivo do Município de Rio Maior, de preservação redutora de dois elementos simbólicos – a “chaminé da mina” e a entrada do plano inclinado –, tomou forma a necessidade de propor, de acordo com a lei nº107/2001, de 8 de Setembro, a abertura de um processo de classificação informado pelo volume de conhecimento existente sobre o período mineiro e sublinhado pelo documento cuja apresentação se conclui no presente número.
Sob iniciativa do técnico promotor do processo de estudo do património arquitectónico riomaiorense, e subscrita pela Junta de Freguesia de Rio Maior foi a proposta apresentada em Setembro de 2006 não se obtendo resposta da parte do Município.
Após previsão, em orçamento municipal para 2007, da venda dos terrenos do antigo complexo mineiro, adquire especial pertinência a sensibilização dos responsáveis autárquicos para a criação dos instrumentos legais de preservação da integridade do mais significativo conjunto patrimonial do século XX local.
A Petição pela Classificação do Património Mineiro surge assim enquanto procura de uma demonstração significante do empenho cívico da comunidade riomaiorense na necessária valorização local de um conjunto edificado reconhecido pelas mais credenciadas entidades nacionais.

Pela Comissão: Nuno Alexandre Rocha, João Afonso Calado da Maia, António Feliciano Jr., José da Silva Pulquério, Manuel Sequeira Nobre, João Pulquério de Castro, Eva Raquel Neves.

In Região de Rio Maior nº970, de 11 de Maio de 2007

sábado, maio 05, 2007

Património Mineiro e Industrial em Rio Maior . Parecer do IPPAR (Parte 2, final; Parte 3)

II. Mina (continuação)

1.2.1. Fábrica de briquetes.

a) A fábrica de briquetes é a evidência material de maior significado patrimonial que teimosamente subsistiu a esta negligência da memória, embora o seu estado de conservação não seja bom e a sua refuncionalização, ausência de manutenção e a remoção de todo o equipamento técnico ou funcional tenham deixado um espaço ferido na sua essência funcional e integrador de uma memória de trabalho singular. Hoje temos um conjunto que, apesar de não ter problemas estruturais, sofreu já algumas pequenas intrusões ou adaptações dependentes do seu reuso como oficinas ou armazéns camarários.

b) A fábrica de briquetes não pode ser entendida como um edifício isolado que corresponderia à fase efectiva da obtenção dos briquetes. Localizada junto à entrada da galeria da mina do Espadanal, a sua implantação é indissociável da fase inicial da extracção do minério e do sequente processo de tratamento do mesmo. Integradora de um conjunto de pequenos edifícios articulados por um característico sistema de telas transportadoras assentes em estruturas de betão armado, a fábrica incorpora o sistema de ensilagem, a área da central, da obtenção do produto e o antigo cais da via férrea, hoje já desaparecido para dar lugar a um complexo multiusos. Temos, assim, a fase da extracção/ ensilagem (em dois momentos) / do fabrico/ da expedição.

c) Do conjunto destaca-se e impõe-se o edifício que integrava a central, as bombas, o secador e a prensa, ao qual se poderá chamar a fábrica, propriamente dita (v. planta 05). Intrinsecamente associado à rede de transportadores aéreos de minério, que lhe conferem parte da sua idiossincrasia plástica e funcional, o edifício sobrevive isoladamente como peça arquitectónica de cariz puramente funcional. Respondendo a pragmáticos desideratos produtivos e energéticos o projecto, provavelmente elaborado pelo gabinete de desenho da EICEL, não deixaria contudo de integrar as preocupações em instalar máquinas de enormes proporções provenientes da Alemanha, onde este tipo de fábricas se encontrava associada às minas, de modo a rentabilizá-las. Pode colocar-se a questão se a importação da Alemanha do modelo de fábrica, das máquinas, não implicaria também a aplicação de um desenho standard já existente e que respondesse economicamente ao fim produtivo.

d) Composta por dois volumes paralelepipédicos formando um L, a gramática arquitectónica da fábrica de briquetes reconhece-se na plasticidade permitida pela utilização dos novos materiais de construção, revelada nos volumes puros, na sua geometrização e numa fenestração que rasga verticalmente a horizontalidade dos dois corpos integradores da central termoeléctrica e da prensa, os dois vãos de maior dimensão.











e) A racionalidade presente nas singulares fases de fabrico é evidente nos dois volumes puros que na sua relação com a cidade ainda impõem um sinal de modernidade formal e civilizacional construído nos idos anos cinquenta do século XX, à luz das medidas de desenvolvimento e fomento económico existentes durante o Estado Novo.


III. Moagem.

a) A Moagem Maria Celeste tem a sua data de inauguração para o ano de 1932, representando um momento de afirmação da modernização da indústria moageira de Rio Maior, sentida desde meados do século XIX nas grandes cidades como Lisboa ou Porto.

b) Inserida num contexto de cariz rural, esta moagem localizada no centro da cidade, sobrevive numa autenticidade formal, tipológica e de relação com o espaço envolvente a uma alteração rápida inerente ao crescimento dos centros urbanos.

c) Indissociável do rio, que a viu nascer, a moagem Maria Celeste corresponde a uma tradição funcional mais antiga deste curso de água. Aí se implantaram inúmeros moinhos de água, provavelmente de rodízio. Esta moagem assenta também ou poderá integrar um antigo moinho, pertença da família, sobre o qual edificou um sistema moageiro ainda dependente da energia hidráulica, fenómeno incomum, numa época em que a electricidade, mesmo em locais mais distantes da capital, começava a despontar nas indústrias mais modernas. A presença de um antigo moinho, o saber de gerações assente na força da energia obtida através da água, foram certamente condicionantes na manutenção de uma mesma solução energética ainda que integrando inovações técnicas.

d) Funcionalmente a moagem incorpora a casa do proprietário, ainda hoje habitada pela descendente, o escritório, um local de vendas, de armazenamento, a área energética e a de fabrico de farinha, existindo ainda um volume arquitectónico singular correspondente a um depósito de água.

e) Formalmente a moagem Maria Celeste aproxima-se de alguma linguagem Déco, revelada pelo tratamento formal dos amplos janelões. Contudo, esta assumpção formal desvincula-se do seu sistema construtivo interno caracterizado por soluções mistas – incorpora materiais de construção de ponta para o século XIX – colunas e vigas de ferro, sendo a pavimentação em madeira.

f) Quanto ao equipamento tecnológico, subsiste na área referente à obtenção de energia, tendo as restantes máquinas operadoras sido destruídas após pouco tempo da sua inauguração, provável consequência do condicionamento industrial. São ainda visíveis os veios de transmissão correspondentes à forma mecânica da propagação da energia.












In Região de Rio Maior nº969, de 02 de Maio de 2007