segunda-feira, agosto 18, 2008

I Jornada do Património Mineiro. Comunicações. (parte 14)

(continuação do artigo publicado no jornal Região de Rio Maior nº1035 de 8 de Agosto de 2008, pág.8)

O futuro da Fábrica de Briquetes da Mina do Espadanal.

Embora seja possível e desejável preservar e reutilizar a antiga Fábrica de Briquetes da Mina do Espadanal, há ainda vários obstáculos a ultrapassar, nomeadamente os de ordem financeira. Contudo, nada é impossível se existir vontade e imaginação para os ultrapassar.
A antiga Fábrica de Briquetes da Mina do Espadanal, uma vez recuperada, será um importante recurso para o concelho de Rio Maior. A vários níveis. A sua reutilização possibilitará, por exemplo, a instalação de equipamentos que o município ainda não dispõe, como é o caso do arquivo municipal. Ou, ainda, um museu sobre a história da mina e da fábrica, o que seria também uma excelente solução, tanto mais que não há, praticamente, museus mineiros em Portugal. Mas, para além destas e, eventualmente, de outras soluções que se possam encontrar para a futura fábrica reabilitada, o facto da mesma constituir um magnífico exemplo de arquitectura industrial modernista – a fábrica foi projectada em 1951 pelos engenheiros alemães Helmudth Kuhn e Lipe, tendo sido concluída em 1955 – poderá atrair visitantes ao concelho, desde que seja efectuada uma adequada divulgação.

Poderá parecer um tanto ou quanto insólito apontar a importância da sua promoção no âmbito do turismo. Na realidade, o turismo representa hoje em dia uma das mais importantes actividades económicas e, obviamente, todas as entidades do sector procuram captar para as suas regiões o maior número de turistas, e os operadores turísticos oferecem uma grande variedade de programas cada vez mais aliciantes. No entanto, o tipo de turismo que se pretende captar com base numa oferta de descoberta do património industrial não é fundamentalmente um turismo de massas, o qual, aliás tem vindo a ser abandonado por muitos responsáveis deste sector, mas sim um turismo cultural, captando um público com interesse em conhecer as realidades culturais das regiões que visita, com poder de compra, com interesse em permanecer pequenas temporadas para melhor explorar todas as vertentes da oferta, ou seja, capaz de fazer com que o retorno dessa actividade seja compensador para essas regiões. E o concelho de Rio Maior tem muito a oferecer neste âmbito.

Há, no entanto, algumas questões que necessitam de ser equacionadas. Em primeiro lugar é necessário apostar na criação de infra-estruturas, tais como alojamento, restauração, centros de acolhimento de visitantes – que podem ser os postos de turismo desde que possuam materiais de divulgação e os seus funcionários sejam alvo de uma formação mínima –, museus, sítios visitáveis, sinalética rodoviária, etc.
No que respeita aos museus – e baseando-nos nas experiências europeias – nas duas últimas décadas, novos
museus e projectos de museus industriais multiplicaram- se um pouco por toda a parte. Nalguns países, como a Grã-Bretanha, os museus industriais foram durante a década de 1980 o tipo de museus que mais cresceu quantitativamente, acompanhando o desenvolvimento e a consolidação da arqueologia industrial naquele país.
Salvaguardando as necessárias diferenças, é nessa perspectiva – de criação de museus, de centros de interpretação, musealização de sítios, etc – que devemos trabalhar. Ou seja, sem os indispensáveis “recursos de património industrial” não será possível elaborar programas de turismo industrial susceptíveis de alcançar um sucesso económico.
Mas não bastam os recursos, embora facilmente se reconheça a sua importância. É necessário, também, dispor de uma estratégia para a promoção do turismo industrial, e esta deverá ser assumida pelas entidades responsáveis pelo turismo.
Estamos convencidos que, actualmente, a antiga Fábrica de Briquetes da Mina do Espadanal já não é encarada com a insensibilidade que ainda há bem pouco tempo a rodeava. As potencialidades que encerra estão à vista de todos. E, tal como no passado, poderá ainda ter muito a dar para o desenvolvimento social, económico e cultural de Rio Maior.

AGRADECIMENTOS:

A Comissão para a Defesa do Património Cultural do Concelho de Rio Maior agradece a colaboração das entidades participantes e dos riomaiorenses na concretização da I Jornada do Património Mineiro.
À Associação Portuguesa de Património Industrial, em particular ao Dr. José Manuel Cordeiro e ao Prof. José Manuel Brandão, pelo insuperável apoio concedido ao processo de salvaguarda do património mineiro.
Ao arquitecto Jorge Mangorrinha pela relevante colaboração e apoio concedido.
Ao Município de Rio Maior, na pessoa do Sr. Presidente da Câmara Municipal, Dr. Carlos Nazaré, pela cedência da Biblioteca Municipal e pela disponibilidade para análise dos temas do património.
À Sr.ª directora da biblioteca municipal, Drª Paula Pinto, e a todos os funcionários pelo suporte técnico na realização do evento.
Ao arqueólogo Carlos Pereira (CMRM) pela cedência de elementos para exposição.
Aos Srs. José Luís Crisóstomo Ferreira e Vítor Crisóstomo Ferreira pela cedência de maquinaria original do complexo mineiro, para exposição.
Ao Sr. Joaquim da Costa Nazaré pela cedência de fotografias de época para exposição.
Ao Sr. António Severino Pereira (antigo mineiro), pela cedência de material iconográfico para a exposição.
À Sr.ª Dª. Maria Irene Vieira de Carvalho, pela incansável colaboração na recolha de elementos para exposição.
À Sr.ª Dª. Maria Augusta de Sousa, pela cedência de suportes expositivos.
À loja Electro 21, Electrodomésticos, pela cedência de meios audiovisuais para a exposição.
À empresa O Polícia, Materiais de Construção Lda., pelo transporte e colocação na biblioteca municipal de moinho de cilindros da antiga Fábrica de Briquetes.
À tipografia Riográfica pela impressão do material gráfico de divulgação do evento.
À comunidade riomaiorense e visitantes, pela presença e participação na I Jornada do Património Mineiro do Concelho de Rio Maior.

COMISSÃO PARA A DEFESA DO PATRIMÓNIO CULTURAL DO CONCELHO DE RIO MAIOR in Região de Rio Maior nº 1036, de sexta-feira 15 de Agosto de 2008.

domingo, agosto 10, 2008

I Jornada do Património Mineiro. Comunicações. (parte 13)

(continuação do artigo publicado no jornal Região de Rio Maior nº1034 de 1 de Agosto de 2008, pág.8)

No caso das minas que têm vindo a ser encerradas, para além de provocarem uma situação de depressão económica e social nas respectivas regiões, assim como graves problemas ambientais, o seu património encontra-se a atravessar um processo de degradação muito rápido, correndo o risco de vir a desaparecer por completo. Há já alguns anos foi anunciado que as minas abandonadas seriam alvo de regulamentação por parte do Ministério do Ambiente que, em articulação com o Instituto Geológico e Mineiro, actual LNEG, elaboraria um plano para requalificar as mais de cinquenta minas abandonadas que já se encontravam identificadas. Em causa está o problema do encerramento das minas sem responsáveis assumidos, provocando assim um vazio de responsabilização que impede a subsequente tomada de iniciativas tanto no domínio ecológico, tendo em vista a poluição por elas causada, como no patrimonial.

Reutilização do património industrial

Uma das soluções que têm sido postas em prática para salvaguardar o património industrial – quando este apresenta qualidade arquitectónica, assim como valor histórico e patrimonial que justifique essas medidas, como é o caso da Fábrica de Briquetes da Mina do Espadanal – consiste na sua reutilização. De facto, a conjugação da engenharia, da arquitectura – tendo em consideração os seus desenvolvimentos registados nas últimas décadas –, com as características particulares do património industrial – solidez de construção, amplos espaços interiores, etc – oferece um enorme leque de possibilidades para a preservação deste tipo de património. Apesar se constituir uma prática ainda pouco desenvolvida em Portugal, a reutilização tem vindo a constituir a opção preferencialmente adoptada para a salvaguarda do património industrial, uma vez que são inúmeras as soluções e possibilidades que encerra. Importa, salientar que algumas entidades nacionais comungam também desta mesma interpretação, tendo já sido realizado, um Encontro Internacional subordinado ao tema "Em defesa do património cultural e natural: reabilitar em vez de construir", organizado pelo Grémio das Empresas de Conservação e Restauro do Património Arquitectónico (Gecorpa) e o Grupo de Estudos de Ordenamento do Território (Geota).

Adaptar e continuar a utilizar edifícios industriais preserva a fisionomia e as características urbanísticas de uma determinada zona citadina, ao mesmo tempo que evita gastos desnecessários com processos de demolição e posterior construção, contribuindo também para o desenvolvimento económico sustentado.
Contudo, como salientou a “Carta para o Património Industrial” elaborada pelo TICCIH – The International Committe for the Conservation of the Industrial Heritage, o organismo consultor da UNESCO para o património industrial –, “a adaptação de um sítio industrial a uma nova utilização, como forma de se assegurar a sua conservação é em geral aceitável, excepto no caso de sítios com uma particular importância histórica. As novas utilizações deverão respeitar os materiais específicos, assim como os esquemas originais de circulação e de produção, e deverão ser compatíveis, tanto quanto possível, com a sua utilização original. É recomendável uma adaptação que evoque a sua actividade original”.

Como foi referido, em Portugal a opção pela reutilização de antigos edifícios industriais é ainda pouco seguida. Prefere-se destruir e voltar a construir de novo, em vez de reabilitar, quando a opção correcta em muitas situações seria a de reabilitar em vez de construir de novo. No entanto, apesar de ainda ser pouco seguida, há entre nós bons exemplos de reutilização de antigos edifícios industriais. A Covilhã, graças à iniciativa da Universidade da Beira Interior, é a cidade portuguesa que mais tem investido na reutilização do património industrial, com magníficos resultados. A Universidade da Beira Interior dispõe de cerca de 180.000 metros quadrados de área construída, e 80% dessa área é área recuperada, ou seja, são as antigas fábricas de lanifícios recuperadas e reutilizadas pelos diferentes serviços daquela Universidade. Mas, na maior parte dos casos, e em grande medida devido à voragem da especulação imobiliária, prefere-se destruir os edifícios sem sequer se equacionar essa possibilidade. Por vezes opta-se por soluções que nada têm a ver com a salvaguarda do património industrial, como, por exemplo, deixar ficar apenas a chaminé embora se tenha arrasado completamente as instalações fabris. Nestes casos, a chaminé – isolada e completamente descontextualizada –, constitui apenas a tradução de um sentimento de má consciência, que procura compensar o acto de destruição do património. Noutros casos opta-se por uma solução igualmente perversa, o “fachadismo”, ou seja, aparentemente conserva-se o edifício industrial mas, na realidade, este encontra-se totalmente alterado e descaracterizado no seu interior, o que significa transformar o património numa espécie de cenário cinematográfico.

Para além do interesse em conservar o património industrial como testemunho de um dos processos mais importantes na história da humanidade, de modo a que os vindouros possam vir a aperceber de como se realizou essa prodigiosa transformação, a sua preservação pode também desempenhar um papel importante na regeneração económica de regiões deprimidas ou em declínio. Como é apontado na “Carta para o Património Industrial”, já referida, “a continuidade que esta reutilização implica pode proporcionar um equilíbrio psicológico às comunidades que se viram confrontadas com a perda súbita de uma fonte de trabalho de muitos anos”.

(continua)

COMISSÃO PARA A DEFESA DO PATRIMÓNIO CULTURAL DO CONCELHO DE RIO MAIOR in Região de Rio Maior nº1035, de Sexta-feira 8 de Agosto de 2008

sexta-feira, agosto 01, 2008

I Jornada do Património Mineiro. Comunicações. (parte 12)

(continuação do artigo publicado no jornal Região de Rio Maior nº1033 de 25 de Julho de 2008, pág.8)





















Dr. José Manuel Cordeiro, durante a comunicação: “Fábrica de Briquetes da Mina do Espadanal, um património a preservar, um património a reutilizar”


PONTO Nº3 DA ORDEM DE TRABALHOS.

A terceira e última comunicação da sessão pública da I Jornada do Património Mineiro abordou, enquanto tema central, a recuperação de espaços industriais representativos de valor histórico e arquitectónico como oportunidade de qualificação do espaço e da vivência urbana contemporânea.

O tema teve apresentação por um dos mais credenciados autores nacionais na área dos estudos do património industrial – Dr. José Manuel Lopes Cordeiro.
Historiador doutorado pela Universidade do Minho com tese sobre “A Indústria Portuense no séc. XIX”, exerce as funções de Presidente da Associação Portuguesa do Património Industrial (APPI), representante em Portugal do Comité Internacional para a Conservação do Património Industrial (TICCIH) e Professor Auxiliar do Departamento de História da Universidade do Minho. É director da revista “Arqueologia Industrial” e autor de extensa e relevante bibliografia, com particular atenção ao património industrial portuense e do Vale do Ave.

Os conceitos apresentados abrem perspectivas sobre as potencialidades do património mineiro riomaiorense enquanto factor de desenvolvimento cultural e económico da comunidade local, estabelecendo em simultâneo um rigoroso enquadramento metodológico da intervenção a realizar na Fábrica de Briquetes da Mina do Espadanal, assente num corpo de conhecimento internacionalmente consolidado.

FÁBRICA DE BRIQUETES DA MINA DO ESPADANAL, UM PATRIMÓNIO A PRESERVAR, UM PATRIMÓNIO A REUTILIZAR.
DR. JOSÉ MANUEL CORDEIRO

O futuro da Fábrica de Briquetes da Mina do Espadanal, um dos mais notáveis exemplares do património cultural riomaiorense, tem vindo a ser ultimamente bastante debatido, uma vez que existem projectos imobiliários para o local, os quais, a concretizarem-se, implicariam a demolição de todo aquele complexo industrial.

Perante a possibilidade de destruição daquela que foi em tempos não muito remotos uma das principais fontes de riqueza do concelho e que, também por esse motivo, se encontra profundamente enraizada na memória colectiva riomaiorense, tem-se destacado a Comissão para a Defesa do Património Cultural de Rio Maior, que através de múltiplas iniciativas tem procurado alertar a opinião pública e as autoridades locais para a importância daquele conjunto patrimonial e, consequentemente, a necessidade da sua preservação.

Poderá para alguns parecer estranho que se procure preservar um antigo edifício industrial e, ainda para mais, considerá-lo património cultural. No entanto, esta é uma realidade que tem vindo a afirmar-se de uma forma generalizada e que em Portugal encontra também vários exemplos. De facto, as profundas transformações que, um pouco por toda a parte, se têm vindo a registar nas últimas décadas, provocaram um progressivo alargamento do conceito de património cultural, englobando os aspectos materiais da sociedade, os quais até então não eram tidos em consideração. Assim, os vestígios materiais da industrialização que marcou os dois últimos séculos, cada vez mais ameaçados de desaparecimento pelas profundas transformações que a sociedade registou nos últimos decénios, passaram a ser encarados também numa perspectiva patrimonial, como testemunhos de um decisivo período histórico na evolução da Humanidade.

Pelo facto de se tratar de um património recente, associado a um sector que tradicionalmente não era considerado com a dignidade e a importância que justificassem a sua conservação, e também de muitas vezes se encontrar em zonas urbanas que irão ser alvo de processos de reconversão, o património industrial é actualmente, no nosso país, um dos sectores patrimoniais mais ameaçados de destruição. Essa situação decorre não apenas de projectos imobiliários que colocam em risco de destruição o património industrial que se localiza nas zonas urbanas, mas também de situações de puro abandono do que se situa em zonas rurais.


(continua)

COMISSÃO PARA A DEFESA DO PATRIMÓNIO CULTURAL DO CONCELHO DE RIO MAIOR in Região de Rio Maior nº1034 de Sexta-feira, 01 de Agosto de 2008.